Acompanhamos, com uma certa preocupação, o aumento quase exponencial dos pedidos de recuperação judicial no agro, demonstrando como o setor responsável por uma parcela significativa do PIB e das exportações do país, apesar dos frequentes resultados positivos e da ajuda governamental, tem oscilado em algumas áreas.

Oscilações no mercado, mudanças climáticas que afetam o campo, alta volatilidade cambial e desafios logísticos são apenas alguns dos fatores que podem levar empresas do agro a enfrentar graves dificuldades financeiras. Nesse contexto, a recuperação judicial (RJ) tem se tornado uma ferramenta essencial para a reestruturação dessas companhias, oferecendo a chance de renegociar dívidas e traçar um novo rumo para suas operações.

Neste artigo, analisaremos as cinco maiores recuperações judiciais do setor agropecuário atualmente em voga no Brasil, destacando os desafios enfrentados e os planos de recuperação implementados por essas empresas. Usamos os dados publicados por um grande escritório de advocacia nesta notícia.

1.     Agrogalaxy Participações (R$ 4,670 bilhões)

A AgroGalaxy Participações, uma das maiores distribuidoras de insumos agrícolas do Brasil, entrou com pedido de recuperação judicial em setembro de 2024. A empresa enfrenta dívidas totais na casa de R$ 4,6 bilhões, acumuladas principalmente com bancos, fornecedores e funcionários.

Esse pedido recente de recuperação judicial no agro entra direto para o primeiro lugar das maiores RJ do agronegócio, tamanha a dívida declarada da empresa, que tem sede em Goiânia-GO. A justificativa do pedido argumentou que os desafios climáticos recentes e a deterioração das condições do mercado agrícola impactaram severamente sua estrutura financeira.

Por conta do pouco tempo desde a autorização para o processo de recuperação judicial pela justiça, a empresa ainda não apresentou o plano de RJ, mas já existe uma liminar suspendendo as execuções das dívidas enquanto ele é elaborado. Até lá, todas as cláusulas contratuais que permitiam a antecipação de vencimentos ou execuções de garantias foram suspensas, com exceção de contratos de derivativos.

Caso ela não apresente um plano de reestruturação no prazo estipulado, a justiça poderá determinar a convocação para a reavaliação do processo ou até mesmo a decretação de falência. Entenda mais sobre o processo de recuperação judicial neste nosso artigo.

2.     Grupo Patense (R$ 2,174 bilhões)

O Grupo Patense, especializado em processar resíduos de origem animal para fabricação de rações, biocombustíveis e óleos industriais, é nosso segundo colocado na lista de maiores recuperações judiciais no agro em 2024. Ele tem enfrentado uma série de problemas financeiros e busca na RJ um fôlego para se reestruturar e continuar suas atividades.

Entre 2021 e 2023, o grupo fez dez aquisições, visando consolidar suas operações no setor. No entanto, algumas empresas adquiridas exigiram investimentos além do previsto, o que resultou em baixo desempenho e aumento da alavancagem financeira, comprometendo boa parte do fluxo de caixa da Patense.

Além disso, a empresa fundada em Patos de Minas-MG alegou que o aumento da Selic e a queda de 40% nos preços de gorduras e proteínas comercializadas pelo grupo impactaram de forma arrasadora seus custos financeiros.

A tentativa de lidar com a situação de forma “caseira”, levou ao crescimento vertiginoso da dívida, que em 2023 alcançou R$ 2,17 bilhões, com mais de 1.000 credores, muitos deles investidores em Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRAs).

O plano de recuperação judicial do Grupo Patense prevê medidas como a venda de ativos, alongamento de prazos de pagamento e descontos nas dívidas. Entre as soluções propostas estão a fusão ou venda de parte do negócio, buscando manter a viabilidade das operações.

3.     Sperafico Agroindustrial (R$ 1,076 bilhão)

A recuperação judicial da Sperafico Agroindustrial, aprovada pela Justiça em dezembro de 2023, envolve uma dívida total de cerca de R$ 1,1 bilhão. O plano homologado pela 3ª Vara Cível de Toledo-PR, próximo a onde a empresa possui sede, prevê um desconto médio de 80% no montante devido e estabelece um prazo de até 20 anos para o pagamento dos credores.

A Sperafico, que já foi um gigante do agronegócio com faturamento de R$ 1,2 bilhão em 2007, justificou o pedido nas dificuldades financeiras pelas quais tem passado desde o início da pandemia, levando à necessidade de reorganizar suas atividades e buscar essa medida de recuperação judicial para assegurar sua sobrevivência.

Entre as principais estratégias do plano de recuperação estão a reestruturação das dívidas do setor agropecuário, a venda de ativos e a manutenção de investimentos essenciais para garantir a continuidade das operações. Os primeiros credores a serem pagos são os trabalhistas, cujos pagamentos começaram em janeiro de 2024.

4.     Usina Maringá Indústria e Comércio (R$ 1,028 bilhão)

Uma das mais antigas recuperações judiciais no agro, a Usina Maringá Indústria e Comércio, parte do Grupo Diné, protocolou seu pedido em junho de 2020. Localizada em Araraquara (SP), mas com decisão judicial concedida pela 1ª Vara de Santa Rita do Passa Quatro (SP), o grupo enfrentava dificuldades financeiras severas, especialmente em relação a dívidas com fornecedores de cana-de-açúcar desde 2013, quando a Usina Maringá interrompeu suas atividades de moagem.

O plano de recuperação apresentado pela empresa visa a reestruturação financeira gradual do grupo, tentando preservar as atividades empresariais, os empregos e honrar principalmente os tributos para evitar a falência. Para tanto, obtiveram da justiça o benefício de dispensa da apresentação de certidões negativas, exceto em casos de contratos com o setor público ou para obtenção de benefícios fiscais.

É importante ressaltar que Usina Maringá perdeu sua autorização de produção de etanol pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) antes do pedido de recuperação judicial, o que agravou o cenário e não lhe deixou outra escolha se não a RJ para sair da crise.

5.     Elisa Agro Sustentável (R$ 679,6 milhões)

O caso da Elisa Agro Sustentável é nosso 5º maior pedido de recuperação judicial no agro, protocolado em fevereiro de 2024, com dívidas totais de R$ 680 milhões. A empresa, localizada no Vale do Araguaia (GO), enfrenta dificuldades financeiras causadas por vários fatores, como a desorganização logística durante a pandemia e a queda dos preços das commodities agrícolas.

Além disso, o grupo fez um investimento pesado para expandir suas operações em agricultura irrigada, cerca de R$ 500 milhões para a instalação de pivôs que irrigariam uma área de 7,2 mil hectares, mas não obteve o retorno esperado, muito por conta da demora em sanar a crise sanitária de 2020-2022.

Parte significativa da dívida (R$ 327 milhões) está atrelada a Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRAs), emitidos para financiar seu plano de expansão. O plano de recuperação da Elisa Agro inclui a reestruturação das dívidas com credores, como bancos e fornecedores, além da avaliação de propostas para venda do controle da empresa.

Como evitar a recuperação judicial no agro?

É difícil prever que uma empresa entrará em crise e será necessário intervir com uma recuperação judicial, no agro ainda mais. São muitos fatores externos que podem agir negativamente sobre a organização, culminando em perdas e, consequentemente, fazendo a coisa “sair dos trilhos”.

Porém, internamente, é plenamente possível agir preventivamente para evitar um descontrole nas contas e deixar as dívidas se acumularem. Por mais que o setor financeiro da empresa esteja a par de tudo e aparentemente controle a situação, ao menor de sinal de alerta é importante contar com uma consultoria financeira e contábil externa, que adicione o elemento “isenção” na análise das contas.

Assim, mesmo que seja necessário entrar com o pedido de recuperação judicial, o representante do agronegócio brasileiro poderá contar com especialistas que conhecem o caso e saberão exatamente como propor a reestruturação das dívidas e encontrar o caminho para sair da crise.

Afinal, um setor tão importante para a economia brasileira não pode ser negligenciado, tampouco contar com a sorte quando o jogo da RJ entra em ação.

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